“ Banco Mundial “se livra” de responsabilidade sobre Aracruz” | Agencia Carta Maior 16/03/2006

Agencia Carta Maior 16/03/2006

“ Banco Mundial “se livra” de responsabilidade sobre Aracruz”

Reportagem de Fernanda Sucupira

Ao conceder um empréstimo de 50 milhões de dólares à Aracruz Celulose, o Banco Mundial por meio da Corporação Financeira Internacional (IFC), em novembro de 2004, também ignorou suas diretrizes, como as que tratam da proteção do direto à terra de populações indígenas e de outras minorias étnicas.
Mas desde abril de 2005 o Banco, pressionado pela Rede Alerta Contra o Deserto Verde e pela Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais, informou a elas, após um longo silêncio, que a Aracruz realizou o pagamento antecipado da dívida. O Banco se desculpou pela demora e afirmou que isso encerra a relação com o cliente e que ele deixa de poder influenciar nas questões levantadas pelas redes. As redes questionavam o empréstimo, por causa dos conflitos envolvidos com quilombolas e indígenas. Os movimentos sociais alegam que uma das diretrizes do banco afirma ser “necessário especial atenção em áreas nas quais investimentos do Banco afetam populações indígenas, tribos, minorias étnicas ou outros grupos cujo status social restringe a sua capacidade de defender seus interesses e direitos a terras e outros recursos produtivos”. Outra delas determina que “num projeto que envolve os direitos de populações indígenas à terra, o Banco deve trabalhar com o mutuário para esclarecer medidas necessárias para regularizar a posse da terra o mais depressa possível”.

“É muito importante, então, que o Banco Mundial avalie também a real contribuição para com a população brasileira dessa empresa que ocupa 375 mil hectares de terras em quatro Estados. Hoje, a Aracruz Celulose é a maior latifundiária do Espírito Santo, um Estado onde vivem, conforme dados do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), cerca de 70 mil famílias sem-terra”, afirma a carta da Rede Alerta Contra o Deserto Verde ao IFC que fornece empréstimos a empresas privadas e é um braço do Banco mundial.

Em janeiro deste ano, a empresa participou explicitamente de uma operação violenta da polícia federal, no Espírito Santo, que destruiu completamente aldeias das tribos Tupinikim e Guarani, deixando três indígenas feridos. Por conta disso, a família real da Suécia, vendeu as ações da Aracruz que possuía e as redes avaliam que isso também deixou o IFC constrangido e com pressa para se livrar dessa responsabilidade.

Entidades e movimentos sociais vinham exigindo um posicionamento do Banco Mundial em relação a essas questões. “Queríamos que o empréstimo fosse revogado e que o Banco pressionasse a empresa e o governo federal para que respeitassem as populações impactadas pela monocultura do eucalipto”, relata Winnie Overbeek, da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), entidade que integra a Rede Alerta contra o Deserto Verde.

DESFECHO INSATISFATÓRIO
Depois de vários contatos com integrantes da Rede Alerta Contra o Deserto Verde, foi combinada uma reunião entre o Banco, representantes da rede, de indígenas e quilombolas, em outubro de 2005, na cidade de São Mateus, no Espírito Santo, uma das atingidas pela ação da empresa de celulose. O local foi escolhido para mostrar a situação denunciada, por meio de conversas com lideranças das comunidades quilombolas e indígenas.

Em cima da hora, no entanto, o encontro foi desmarcado pelo Banco Mundial que tentou remarcá-lo na cidade do Rio de Janeiro, com a presença de apenas uma pequena comissão da Rede Alerta Contra o Deserto Verde. “Não concordamos com essas condições e a reunião acabou não ocorrendo. Essa mudança mostra que eles não queriam conhecer a realidade das pessoas, a diversidade do impacto”, avalia Fabrina Furtado, secretária executiva da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais.

Em novembro de 2005, as duas redes exigiram, em nova carta ao Banco Mundial, que fosse mantida a reunião coletiva e fosse tomada uma posição em relação à Aracruz. A resposta só veio na semana passada, com a notícia de que a empresa fez o pagamento antecipado da dívida, o que, para o Banco, retira toda sua responsabilidade e encerra de vez o problema.

Mas as redes da sociedade civil não estão satisfeitas com esse desfecho. “Queremos agora uma posição do Banco Mundial no sentido de que ele não vai mais financiar esse tipo de projeto, nem a Aracruz Celulose, e reconhecer que houve problemas em relação a esse financiamento. Esperávamos também que o Banco tivesse aplicado uma multa à empresa por não ter respeitado as diretrizes do empréstimo”, diz a secretária executiva da Rede Brasil.

Invasão O presidente da Aracruz, Carlos Aguiar, levantou uma hipótese promissora para explicar a selvageria ocorrida na fazenda da empresa: “Setores competitivos do Brasil, como minérios e florestamento, têm sido alvo de movimentos ambientalistas”. Em entrevista à Zero Hora desta sexta-feira (10/3), afirmou que “a silvicultura no Brasil é muito competitiva no mundo inteiro, com muitas vantagens comparadas com os nossos parceiros do Norte. Ou seja, se eu abato o líder (a Aracruz), o resto vem junto”. Ele não pode provar o financiamento de concorrentes internacionais aos ativistas, mas acha que “tem de tudo; há ideologias e há interesses de concorrentes também. Se eu ajudar uma OMG aqui no Brasil, e isso atrasar o processo, eu, que não sou competitivo, em vez de morrer daqui a 10 anos, eu morro daqui a 30 anos”. Quem leu o livro Máfia Verde, já recomendado nesta carta, compreende melhor o que está acontecendo.

Fomento florestal:

De acordo com Wellington, cada hectare cultivado é suficiente para produzir cerca de 250 m³ de toras de eucalipto. E o retorno para o fomentado é garantido porque os preços a serem pagos pela madeira serão livres de impostos e estabelecidos quando da efetivação do contrato. A empresa também assegura que o financiamento e o apoio técnico, para garantir uma melhor produtividade. As áreas fomentadas vão obedecer aos mesmos critérios técnicos e ambientais adotados nos plantios da propria empresa. O fomento, como o cultivo de eucalipto em geral, agrega outro aspecto economicamente interessante para os municípios: a geração de empregos. O plantio e manutenção de florestas de eucalipto geram, em média, um emprego para cada 40 hectares, bem acima da média de empregos proporcionada pela pecuária, de é de um emprego para cada 400 hectares. Até 2008, a Veracel pretende fomentar na região o plantio de 23 mil hectares de eucaliptos.

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