CARTA DE JACARAÍPE

Nós, indígenas (Pataxó, Tupinikin e Guarani), quilombolas, geraiszeiros, campesinos, trabalhadores rurais sem-terra, pescadores, sindicalistas, biólogos, geógrafos, engenheiros florestais, advogados, artistas, representantes de ONGs e outros apoiadores, dos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia, Rio Grande dos Sul, Pará e também do Equador, Uruguai e Costa Rica reunidos no 4º Encontro Nacional da Rede Alerta Contra o Deserto Verde, em Jacaraípe, município da Serra- ES, convocamos a sociedade à reflexão sobre os graves impactos econômicos, sociais, culturais e ambientais provocados pela expansão continental da monocultura do eucalipto e demais culturas geridas pelo agronegócio exportador.

A prioridade dada por nossos governos ao fomento à monocultura do eucalipto, do pinus, da soja, da cana-de-açúcar, entre outras, significa o aprofundamento do processo de concentração fundiária, retrocedendo e impedindo qualquer perspectiva de reforma agrária e de democratização do acesso à terra. Ao ocuparem as terras agricultáveis com a monocultura, o grande capital impede a produção de alimentos essenciais, exatamente onde se alastram a fome e a miséria.

Já foi constatado nos encontros anteriores desta Rede, que o atual Governo Lula e inclusive a Ministra Marina Silva, para espanto geral, reforçam cada vez mais o modelo excludente do plantio de monoculturas de árvores em larga escala para fins industriais, ignorando o desastre ambiental e social causado nos últimos 40 anos. A Rede alerta contra o Deserto Verde entende que não adianta se fazer um grande estudo no país para mapear e propor resoluções para os conflitos entre as comunidades impactadas e as empresas das monoculturas, enquanto o Governo Federal mantiver a meta de ampliação da área de plantações de árvores no Brasil de 2 milhões de hectares até 2007, o que gerará centenas de novos conflitos. Só em Minas Gerais, no ano de 2004, foram plantados quase 150 mil hectares de terra com monocultura de eucalipto!

Reforçamos novamente que queremos um Brasil competitivo no respeito à diversidade étnica e cultural e às necessidades e perspectivas das comunidades locais com ricas experiências de produção agrícola diversificada sem o uso de agrotóxicos. Queremos um Brasil competitivo na proteção e recuperação das áreas degradadas por monoculturas, utilizando plantios de árvores nativas, de forma diversificada, assentando famílias sem terra e utilizando técnicas agro-ecológicas. Exportar cada vez mais celulose e ferro gusa, reforça o modelo econômico dominante no país que produz cada vez mais fome e miséria num país onde milhões de famílias não têm o que comer.

A tudo isso, acrescentam-se novas preocupações como a expansão, através do Protocolo de Kyoto, do Mercado de Carbono, que vem reforçar a desigualdade Norte-Sul e mercantilizar uma questão ambiental das mais graves para a humanidade: a mudança do clima. A mercantilização da questão ambiental é reforçada também através das certificações do FSC e do CERFLOR que, além de não respeitarem as comunidades impactadas pela monocultura de eucalipto, reforçam o consumo sem limite de uma parcela minoritária do planeta, sobretudo nos países do Norte. Além disso, sabemos ser impossível que monoculturas, como as de eucalipto e pinus para fins industriais, sejam socialmente justas, ambientalmente adequada e economicamente viáveis como pretende o FSC, tendo em vista ainda as certificações dadas a empresas causadoras de enormes impactos sociais e ambientais

Pergunta-se: o que é mais importante? O direito básico e constitucional dos indígenas Tupinikim e Guarani, por exemplo, a suas terras, a sua cultura e a sua sobrevivência, ou o lucro obtido pela Aracruz Celulose através do aumento de suas exportações de celulose para fabricação de papel descartável no chamado primeiro mundo? Reafirmamos acreditar num outro mundo possível, que leve em conta os direitos e o bem estar de todas as populações, com toda a sua diversidade. Não podemos ceder a um mundo cuja lógica imposta é o consumo sem limite, o materialismo e a questão econômica-financeira, aprofundando a desigualdade e a exclusão.

Por tudo isso, em nosso IV Encontro Nacional tomamos as seguintes resoluções:

    • Fortalecer a resistência e as lutas locais contra as monoculturas que invadem as terras dos indígenas, quilombolas, geraiszeiros e demais campesinos;
    • Pressionar para que terras indígenas e quilombolas sejam demarcadas;
    • Exigir que o Ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, demarque imediatamente os 18.070 hectares de terras indígenas Tupinikim e Guarani, no Espírito Santo;
    • Fortalecer projetos de reconversão do eucalipto em áreas agricultáveis, garantindo a segurança alimentar do povo, a proteção dos recursos hídricos e a diversidade cultural;
    • Fortalecer a articulação e o apoio mútuo entre os países da América Latina que enfrentam a monocultura através da Rede Latinoamericana de Luta contra as Monoculturas de Árvores;
    • Descredenciar a certificação do FSC (Conselho de Manejo Florestal) para plantações de árvores em larga escala;
    • Descredenciar também outras certificações como o CERFLOR;
    • Estimular uma formação profissional voltada para as demandas dos trabalhadores rurais;
    • Intensificar a divulgação e crítica ao mercado de carbono, através de trabalhos nas comunidades e via instrumentos alternativos de comunicação;
    • Criar um dia nacional de luta contra o mercado de carbono;
    • Repudiar o posicionamento da Ministra de Meio Ambiente Marina Silva em favor do setor industrial de base “florestal”;
    • Repudiar as ambigüidades cometidas na elaboração do Plano Nacional de Florestas (PNF) e exigir do governo e empresas que parem imediatamente a expansão das monoculturas de árvores no país e priorizem, o quanto antes, uma consulta séria e profunda com todas as comunidades impactadas pelas monoculturas, para subsidiar a elaboração de uma nova política, verdadeiramente florestal no país, integrada a políticas de reforma agrária, segurança alimentar, agro-ecologia e reflorestamento diversificada;
    • Exigir a execução das deliberações das Conferências de Meio Ambiente (nas esferas municipais, estaduais e nacional);
    • Repudiar a elaboração do relatório “Temas conflituosos relacionados à expansão da base florestal”, feito pelo Ministério do Meio Ambiente, como resposta oficial à situação vivida há anos pelas comunidades que sofrem dos diversos impactos negativos das plantações de árvores em larga escala no Brasil;
    • Exigir que o MDA impeça a aplicação de recursos públicos do PRONAF para o plantio de monoculturas;
    • Pressionar os núcleos dos DRTs para atuarem junto aos multilados e acidentados do corte do eucalipto e ao trabalho escravo nas carvoarias.

 

Junho de 2005
Rede Alerta Contra o Deserto Verde

Manifesto
La delegación ecuatoriana representantes de las organizaciones: CONAIE – Confederacion de Nacionalidades Indígenas del Ecuador; ECUARUNARI – Nacionalidades de Los Pueblos Kichua del Ecuador, Acción Ecológica y FUNDECOL – Fundación de Defensa Ecológica, comprometidos por la defensa de sus territórios, por la dignidad y soberania de los pueblos, expresamos nuestra solidaridad y respaldo a nuestros hermanos indígenas (Tupinikin y Guarany), quilombolas y a las organizaciones campesinas de Brasil que luchan incamsablemente por el respeto a los derechos humanos y la recuperación de sus territórios que fueron usurpados por las oligarquias nacionales y transnacionales.

Em este contexto rechazamos el fomento de los monocultivos forestales que van em contra de la sobrevivencia de la humanidad.

Extraído de: http://www.wrm.org.uy/inicio.html

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